quinta-feira, novembro 27, 2008

Mès que un club!

Normalmente, quando me desloco a um estádio de futebol (ou a um pavilhão), faço-o na ânsia de assistir a uma vitória da equipa pela qual torço (que habitualmente é o Benfica). A qualidade exibicional é um factor que fica para segundo plano. Contudo, na última quarta-feira, desloquei-me ao Estádio Alvalade XXI com o mesmo estado de espírito de quem vai assistir a uma ópera. Não hesitei em contribuir com 30 Euros (60 Euros, se considerarmos também o preço do bilhete da minha namorada) para a receita de bilheteira de um dos maiores rivais do meu clube, na esperança de ser deslumbrado por um Barcelona que está a praticar o futebol mais atractivo da Europa.

Não vi um Barcelona na máxima força. Iniesta está lesionado, Puyol e Yaya Touré não vieram a Lisboa e Eto'o ficou no banco, por exemplo. E mesmo limitando-se a jogar o q.b. perante um Sporting amorfo, apático, macio, sem agressividade nem atitude, o Barcelona impressionou-me. E concluí que na televisão não nos conseguimos aperceber da dinâmica que o Barça imprime ao seu jogo. É incrível a cultura de posse de bola e de passe curto, a ocupação de espaços e a técnica individual dos seus jogadores. O "chutão" para a frente é uma expressão que não entra no léxico de Guardiola y sus muchachos blaugranas. É raríssimo qualquer jogador efectuar cruzamentos inócuos.

Não vou dissecar os muitos erros que o Sporting cometeu ao longo do jogo. Os jogadores e a equipa do Sporting são muito inferiores ao Barcelona e sabem-no, o que, aliás, acontece com qualquer equipa portuguesa e com a maior parte das equipas europeias. Em cima disso, o Sporting até se pode queixar do azar e do anormal número de deslizes individuais infantis que foram cometidos.

Mas o Barcelona é sinónimo de futebol-espectáculo, o equivalente ao showtime dos Lakers da década de 80, de Magic Johnson e Kareem Abdul-Jabbar. Daniel Alves é um atacante disfarçado de defesa-lateral. Quando em posse de bola, recorrentemente o lateral brasileiro avançou para uma posição de extremo, beneficiando da tendência de Hleb para pisar terrenos mais centrais. Piqué abria um pouco mais na direita e, no lado contrário, Cáceres recuava e assumia-se como terceiro central. Do lado contrário estava um losango a meio-campo, onde não havia um extremo que acompanhasse as subidas de Daniel Alves. O interior-esquerdo, Moutinho, não sabia se acompanhava o brasileiro ou se marcava Xavi, tão só o melhor jogador do Euro'2008.

Chegamos então a Xavi. Em pezinhos de lã, sem dar nas vistas, dos pés dele a bola sai sempre para o local certo, no tempo certo. O primeiro toque é para a recepção, o segundo é para o passe. Sempre de cabeça levantada. Absolutamente fantástico. O miúdo Sergio Busquets jogava como um veterano e até Gudjohnsen parecia um "jogador da bola". Com 3 jogadores no meio-campo, contra 4 do Sporting, cada jogador do Barcelona tinha sempre um colega livre a quem endossar a bola. Parece um contrasenso, não é?

E na frente... Messi. Para quê falar de Hleb ou de Henry (longe, muito longe dos tempos do Arsenal)? Bola nos pés da Pulga é sinónimo de arte. Se na recepção da bola, Messi a consegue colar ao pé esquerdo, depois é virtualmente impossível roubar-lha sem cometer falta. Se não se fizer falta, é certo que a baliza do adversário vai correr perigo. Se se fizer falta, pode sempre haver um qualquer Xavi para enviar a bola à trave na sequência do respectivo livre.

Em suma, fiquei maravilhado e vou guardar para sempre a recordação desta ária, perdão, partida de futebol que, mesmo não sendo brilhante, mostrou que ainda pode haver lugar para o romantismo no futebol moderno, no futebol-indústria.

P.S.: Para quem desconhece, o meu avô materno era catalão e barcelonista ferrenho. Daí ter o apelido Miró, do qual muito me orgulho. E só há dois clubes pelos quais tenho mais carinho do que o Barcelona: o Benfica e o Manchester United. Mas quero deixar bem claro que a minha presença no Alvalade XXI se deveu à vontade de assistir in loco a esta máquina de futebol, mais do que propriamente devido a qualquer paixão clubística.

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